Estudantes da UFRJ recorrem à Justiça para assistir às aulas no Fundão, devido a problemas no campus de Macaé, como falta de professores médicos

Fonte O GLOBO.
RIO - Aulas de anatomia sem cadáver, escassez de professores médicos e laboratórios insuficientes. Esse é o panorama do curso de Medicina da UFRJ no campus de Macaé. Os sintomas já incomodam os estudantes, aprovados num dos vestibulares mais concorridos do Rio, e que, agora, buscam um remédio. Cerca de 25 alunos procuraram a Defensoria Pública da União no Rio de Janeiro (DPU-RJ), que vai ajuizar uma ação civil pública hoje contra a UFRJ para que os estudantes tenham direito a assistir às aulas no Fundão.
- Nossa ideia não é fechar o campus de Macaé, mas, enquanto ele não é fortalecido com investimentos, os alunos de Medicina precisam ter essa opção - explica o defensor André Ordagcy.
A goiana Nayara Lopes, de 24 anos, entrou na segunda turma do curso, em 2010, e está indo para o terceiro período, mas até pensa em fazer outro vestibular.
- Estou deprimida. Até pedi ajuda psicológica à UFRJ, pois não paro de chorar. Meu sonho é passar para outra faculdade e sair daqui, pois falta o mínimo de infraestrutura e organização. Estou preocupada com o conhecimento que vou ter. Temos aulas junto com os alunos de Nutrição e Enfermagem - ela diz.
Zenaide Silva já está de malas prontas para ir estudar na Universidade Federal de Pelotas. Depois de um ano em Macaé, ela decidiu fazer o Enem de novo e passou.
- Achei que era o mesmo padrão UFRJ do Fundão, mas a qualidade das aulas é muito ruim. Eles abriram um curso sem estrutura. Ouvimos muito que éramos cobaia para criar demanda. Agora terei que estudar mais longe de casa - conta Zenaide, que é de Resende.
Ricardo Cantarino estudou durante um ano e meio numa faculdade particular até passar para a UFRJ e diz que o ensino deixa a desejar em Macaé.
 
- Lá fiz muita aula prática que não tive aqui. No semestre passado, houve apenas uma aula de anatomia para ver todos os músculos. Como aqui não há peças molhadas (no formol), tivemos que ir ao Fundão. A segunda ida foi inviabilizada porque os alunos de Nutrição tinham outra aula no dia. Além disso, faltam professores médicos - reclama Ricardo.
O coordenador do curso, Paulo Eduardo Xavier de Mendonça, não nega a realidade relatada pelos estudantes, mas relativiza os acontecimentos.
- Existem poucos médicos em disciplinas pesadas da ciência como anatomia, fisiologia, bioquímica, biofísica, mas isso não é um problema. Os professores médicos acabam sendo mais importantes no ciclo clínico - pondera Mendonça.
Segundo ele, as aulas integradas da Medicina com Nutrição e Enfermagem estão de acordo com as novas diretrizes curriculares do MEC, apesar de o relatório de avaliação do ministério apontar isso como um dos pontos negativos do curso.
- As biociências que um médico precisa saber não são diferentes das que nutricionistas, enfermeiros ou farmacêuticos precisam. Temos um corpo docente específico para ensinar, mas o conteúdo é o mesmo - garante o coordenador.
No entanto, o mesmo relatório do MEC que dá nota 3 (em 5) para o curso e o avalia como satisfatório, afirma que "uma maior proporção de docentes médicos se faz urgente".
Quanto ao anatômico de Macaé, Mendonça diz que o laboratório não foi projetado para trabalhar com peças conservadas em formol. Na semana passada, chegaram as primeiras peças plastinadas, técnica de preservação permanente do material cadavérico, conservado por resina de silicone, as quais não é possível dissecar.
 
- Diante da dificuldade de trabalhar com a peça cadavérica, a melhor solução que encontramos foi essa. E o departamento de anatomia do Fundão acha viável. Eu não sou anatomista - alega o sanitarista. - Houve o planejamento de duas idas ao Fundão para estudar músculos, mas uma delas foi suspensa por uma razão que desconheço. É horrível ter que ver tudo num dia só. Mas o aluno pode estudar no livro, onde se aprende mesmo. A peça serve para fixar o conhecimento.
Luís Fernando Moraes, presidente do Cremerj, tem opinião diferente. A instituição enviou um manifesto de apoio aos estudantes. Para Moraes, o ensino tradicional com professores médicos ainda é necessário:
- Acho legítimo o movimento dos futuros médicos brigando pelo direito de ter a mesma qualidade oferecida no campus do Rio. A formação do médico é mais específica do que as outras carreiras. Ele vai usar o ensino de anatomia de forma diferente, por isso o uso de peças molhadas é importante. Nelas, a percepção das estruturas anatômicas, como músculos, nervos e veias, é muito melhor.

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